sexta-feira, 27 de abril de 2007

(onde o traço se torna existência)

Então escrever é o modo de quem tem a palavra como isca: a palavra pescando o que não é palavra. Quando essa não-palavra - a entrelinha - morde a isca, alguma coisa se escreveu. Uma vez que se pescou a entrelinha, poder-se-ia com alívio jogar a palavra fora. Mas aí cessa analogia: a não-palavra, ao morder a isca, incorporou-a. O que salva então é escrever distraidamente.

Dia desses resolvi que ia escrever algumacoisaqualquercoisa. Aqui ou no meu caderno, tanto faria. Comecei: Lóri se cansava muito porque ela não parava de ser.

Hoje, sem meu mp3, fui reler Água Viva, a obra mais acessível no momento. Às vezes me entristece um pouco, gostar tanto das palavras e não saber usa-las. Não chega a ser um problema, no entanto, porque Clarice já disse tudo por mim.

conseguirei um dia parar de viver? ai de mim que tanto morro.

Dia desses, na faculdade, avistei uma revista com um especial sobre ela. Lindo, cheio de fotos, cheio de escritos, cheio de tudo. Normalmente não permaneço na biblioteca no horário do intervalo. Pessoas, barulho, bagunça, caos. Ao ler Clarice, porém, nada disso existia. É magia, digo com propriedade.

Eu que sou tudo isso, devo por sina e trágico destino só conhecer e experimentar os ecos de mim, porque não capto o mim propriamente dito.

Esse alvoroço interno provavelmente se deve à exposição de aniversário do Museu da Língua Portuguesa, de aniversário do lançamento dA Hora da Estrela, que tem como tema minha ídola-mór de todos os tempos. A qual estarei visitando na data de amanhã. E depois-de-depois-de-amanhã. E muitas outras vezes.

Mas, conforme acabei de confessar para minha querida amiga Elvinha, tenho medo de me decepcionar com a exposição em questão. Usualmente faço isso. Crio expectativas maiores que o mundo. E, usualmente, as coisas do mundo não tem como ser maiores que o mundo...

: será que consigo me entregar ao expectante silêncio que se segue a uma pergunta sem resposta? Embora adivinhe que em algum lugar ou em algum tempo existe a grande resposta para mim.


Elva, na sua inteligência de sempre, disse-me para parar de pensar. Acho que escrever um post sobre isso não é bem 'parar de pensar'. Mas já estava escrevendo o post antes, queria compartilhar esses trechos maravilhosos com vocês...

Embora às vezes grite: não quero mais ser eu!! mas eu me grudo a mim e inextricavelmente forma-se uma tessitura de vida.


O que te falo nunca é o que eu te falo e sim outra coisa.

Hora dessas pensei: será que se eu tivesse nascido no mesmo dia e mês porém há trinta anos Clarice ia ser minha amiga?
Ela já escreveu diversas vezes sobre leitores com os quais se comunicava por carta, leitores que ligavam para ela, que a visitavam, etc... Gostaria minha ídola de conversar comigo - especialmente sabendo que compartilhamos a data de aniversário, podíamos dividir o bolo - ou iria ela me achar por demais boba?

Isso, infelizmente, não tenho como saber.
Felizmente, no entanto, posso, então, decidir que ela gostaria, sim, de conversar com minha pessoa. E ficaria extremamente feliz de conhecer uma pessoa que compartilha, sim, de seus pensamentos.
...
Uma pessoa que a vive.

O instante é semente viva.

Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é passível de fazer sentido. Eu não: quero é uma verdade inventada.

6 comentários:

Elva disse...

Lucy,
seu texto está simplesmente lindo....

Anônimo disse...

oieeeeee!
acho que ela gostaria muito de conversar com vc. ñ somente pq vc se interessa pela obra dela e ambas dividem os mesmos pensamentos, mas sim pela pessoa maravilhosa que vc é.
_só passando pra deixar um oie mesmo
bjs....!

Anônimo disse...

oieeeeee!
acho que ela gostaria muito de conversar com vc. ñ somente pq vc se interessa pela obra dela e ambas dividem os mesmos pensamentos, mas sim pela pessoa maravilhosa que vc é.
_só passando pra deixar um oie mesmo
bjs....!

Joanna disse...

tia lu, vc escreve bem =] pode escrever sobre essas coisas no erro tb, nao eh pra ter nenhum padrão ou estilo la, eh pra escrever oq tem vontade, sobre oq quiser e ser vc mesma, ok?

bjinhus

Adu disse...

friend, te juro que nunca imaginei que diria isso um dia, mas eu já lí quase todo o livro que ganhei de Clarice, e estou gostando do livro... Exposição?! Onde?!
(Impossível alguém não querer ser seu/ua amiga/o).

Kisses friend,

Clara Mazini disse...

Também adoro a Clarice. Uma literatura intensa e ao mesmo tempo tão delicada.